quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Falando de depressão - grilhões na alma em susto

Amarrada sem correntes, presa com portas abertas
giro no mundo, giro no quarto, giro no delírio
me peso no pêso e na consciência
cobro a vida, a vida me cobra

Choro de dor de saudade, choro de culpas
me dou parabéns, me dou desalento
busco acalantos, busco aconchego
busco verdades e minto pra mim

Sou purpurina, tinta guache, papel dourado
caixa amassada, roupa surrada, suco de limão
sou gargalhada, poeta e feiticeira
detetive, palhaça e faxineira

Conheci amores egocêntricos, elegantes, mau caráteres
radicais, melosos, estúpidos
cavalheiros chatos, jovens abusados
cativantes, cativeiros, amarrada estando livre

Subi em palcos, aplaudi na platéia
recebi elogios, magoei, arranquei a máscara
me prejudiquei, prejudiquei pessoas
abusei, me lambuzei na burrice

Fui carinhosa, atenciosa, grande idiota
me arrisquei nas madrugadas, esperei amanhecer
estive em apuros, consegui escapulir
queria ser tanta coisa, sou Roseli

Roseli grávida ,fecundada na cama do amor
gerei duas filhas, lhes entreguei a luz e o meu amor
amor que eu tinha, o qual eu conhecia
dei carinho e atenção o quanto eu podia

Dei meu leite, banho e brincadeiras
dei broncas, passei noites em vigília
molhei chupeta em açúcar achando que bem eu fazia
chorava junto com dores que eu não tinha, mas que meu coração sentia

Cantei sem saber cantar, inventei histórias
fiz desenhos sem saber desenhar
fui mãe e as vezes madrasta.
dei tudo que tinha pra dar

O tempo passou, correu, caminhou
cresceram, amaram, filhos geraram
fiquei avó, fiquei coruja, fiquei feliz
um dia, assim, um dia, chegou quieta, sem alarde

Arrancou de mim, arrancou dela a vida que lhe dei
arrancou dos meus braços a mulher que eu gerei
levou para sempre aquela que foi brejeira e faceira
levou a mulher doce, mãe carinhosa, filha amorosa.

Fico trancada, a janela fechada ameniza
o barulho da rua, o latido do cão se faz mais distante e a música mais amena
posso fugir um pouco disso? posso fugir de mim?
estou aqui, posso fechar a porta, escurecer o quarto, escrever, mas posso fugir de mim?

Estou aqui dentro de mim, minha cabeça junto comigo, os pensamentos só a mim pertencem
minhas dores só em mim doeram
a saudade só minha está dentro de mim.
busco ajuda, carinho, atenção.

Fico sonhando que alguém se lembrará: - alô, como você está? - só sonho.
O telefone não toca, a campainha não toca, não tem buzina na porta
mas ao invés de trancar tudo poderia objetivar minha busca, antar minha procura, conseguir me bastar, abrir a janela, ouvir o cão ladrar, buscar o que de bom pode a música me dar

Cantar, gargalhar, buscar um novo amor
regar uma planta, ouvir quem precisa falar
falar com quem quer e pode me ouvir
cobrar o que de fato me é devido receber

Não posso fugir de mim, não quero fugir de mim.
quero fechar a porta e trancar a janela para minha proteção
manter o coração aberto, derramando luz e atenção.

Quando?

Renascer, quando?
Nem ela, nem eu.
Não posso mais te gerar.
Nasceu, mas partiu.
Viver? Sim, como puder.
Cheia de nós, te amando, te buscando, te pensando, uma busca sem volta.
Corre o rio poluído, chora a criança sem mãe.
Morre a mãe e deixa o filho.
Morre o filho e deixa a mãe.
Quero entender, aprender, como fazer?
Ninguém me responde, a lua se cala, a estrela se esconde, o mar se enfurece.
Ninguém me escuta, a gruta escurece, minha alma padece, não sei fazer prece.
O estomago revira, a dor se aguça, não sei mais falar com você.
O choro chega, a loucura me invade, morta, me dói escrever.
Me arrasta a saudade, me invade a maldade.

Tempestade na alma

Assim como a chuva, pesada, gelada e cheia de fúria com vento arrastando, céu carregado, nuvens espessas, clarões de fogo, pedidos de socorro, perdida no choro.
Pés enrugados, dedos crispados, solidão encardida, com a casca apodrecida da ferida que não cicatriza, caminho pra frente mas arcada de peso de alma doida, de grito preso, de voz embebida.
Tenho chispas nos olhos, fagulhas douradas, caminho sem doce no mel, sem perfume nas rosas, com chuva de restos caídos do céu.
Algo chega na terra de chicote nas mãos: açoita minha alma, grunhe a boca e o suor escorre como seiva do caule.
Veneno que mata a vida no jardim, jardim que acolhia margaridas tristes que não quiseram brotar pois ela não estaria mais lá.
A terra cansada, seca e suja, se agarra nas muretas manchadas de tinta; terra que restou das águas que limparam marcas da vaidade de uma casa limpa.
Mas na casa, mora a saudade. No jardim, a solidão e no quintal a gargalhada que emudeceu.

Dor

Imensa como o oceano. Infinita, sem rumo, sem bóia, sem barco, sem salva-vidas.
Cheia de sal, com o sol escaldante, ondas gigantes de um verde brilhante, tendo o céu como guia.
Cheia de choro e de boca amarga, com mãos ressecadas, pele queimada; à deriva de um sonho, espero chegar à praia.
Chegando na areia de alma rasgada, sem direção, perdida, açoitada no coração.
Chegando na areia, enxarcada, cheia de algas, sangrando ferida pelas pedras, soluçando sem lágrimas.
Ao longe um monge, um frei de chapéu, um anjo sem asas caído do céu.
Uma moça de branco, um ramo de flores, com pés descalços e um sorriso encantado, prateada de estrelas, buscando o mar, partindo nas ondas, sumindo no ar.

Pequena conversa com Cauê

- Cauê, você quer escrever alguma coisa para sua mamãe?
- Pra quê, vó, minha mãe já morreu. Ela não pode ler...
- Eu sei, meu amor, mas é uma lembrança pra gente guardar.
- Vó, as pessoas tinham que escrever pra minha mãe enquando ela estava viva...

Pensando - Dayse Sarilio

Pego na caneta e penso em escrever sobre a Chris.
Meu pensamento voa e então vejo a menininha Chris quando nasceu, vejo-a quando começou a andar e a fazer gracinhas, e lembro que só aceitava ir às festinhas que tivessem brigadeiros!
Lembro da menina-moça que patinava no Roller, da adolescente que dançava no clube Ipê.
Lembrei da Chris mulher, exibindo sua linda barriga com o presente que Deus lhe deu em seu ventre.
Menina, moça, mulher, que tão cedo foi embora e que tanta saudade deixou.

Cálice - Leonardo Sarilho - 20/06/05

Aqui passa-se tudo, acontecimentos repentinos onde fico insignificante por não poder mudar nada. E o cálice fica saturado, transborda.
Sinto-me frágil. Queria ter um dom: fazer ela voltar.
O conteúdo não se dissolve, não mais está homogênio, nada posso misturar e parte de mim se foi, evaporou-se.
Será o ciclo da água igual para nós?
Se por ventura for, espero a solução.

Foi hoje, quando acordei

Quando acordei, no mesmo instante eu entendi: amar também se aprende. Isso, eu não sabia que se aprendia.
Pequena menina Maria, tão absorta em fantasias, distante de agonias.
Pequena sonhadora, aprendi a amar Maria.
Tinha algo que eu não sabia, não conseguia amar Maria.
Nesse dia havia sonhado com minha filha e com lágrimas nos olhos derepente entendi: agora sei amar Maria e isso eu não sabia que se aprendia.
Lembrei de minha filha pequena e gentil e as lágrimas rolaram quentes e saudosas de seu encanto e meiguice e nesse instante eu aprendi: agora já amo Maria.
Manhã de saudade, de peito apertado, chorando e querendo entender o que acontecia e aí então me lembrei de você, pequena menina Maria.
E num instante eu aprendi: já posso amar Maria.