domingo, 14 de outubro de 2007

Na noite, assustada

Esbarrando nas pontas de galhos de árvores, percebendo cores viçosas em um jardim de esplendor.
Tremia todo seu corpo, sentia medo da noite, tarde já se fazia.
Seus passos se alargaram com o encanto de pensamentos. A noite era fria mas do seu rosto o suor escorria.
Enlaçava seus dedos, trepidavam seus pés. De canto de olho espiava a esquina, um duende acreditou que via.
Olhou de completo, um vigia se ia.
Aflita, não entendia, como podia tanta agonia?
Buscava somente chegar, se jogar na cama e poder descansar.
Ficar bem quieta, até tudo passar e sempre se lembrar: homem algum merece esse pesar.

Lágrimas

Vi uma lágrima cair. Não olhava no espelho, mas vi uma lágrima cair.
Os olhos gotejavam enquanto eu as matava com as mãos.
Como podiam ser tão pequenas, como gotas de cristal ou de orvalho, como caiam mansas se no peito existia um temporal? Como podiam ser assim, se lá dentro tudo explodia, as labaredas gritavam chegando na alma e no coração?

Outro coração

Tinha um coração, olhos brilhando, boca pintada, sabia sorrir.
Era um coração rosado, tinha festa e muito amor. Alguém atirou uma flecha, ficou espetado e vive zangado. Hoje tenho um coração pálido, desbotado, sem riso na boca e de olhos fechados.
As batidas, antes sincronizadas, hoje não tem ritmo de nada, se assustam a cada momento da vida.
Antes, bailes e muitas risadas, crianças queridas e muito amadas. Hoje está fechado, batendo em descompasso, desalentado.
Tinha dois pés agitados, hoje estão mancos, foram alvejados. Soltavam faíscas douradas, deles escorriam estrelas em cascata. Onde espaço exagerado, agora muito apertado.
Fechou os ouvidos, cerrou os olhos, emudeceu as palavras.
Dentro do peito passeava, cantava canções. Hoje está acorrentado e a chave se perdeu.

Palavras

Há muitos anos, li um caderno seu por pura curiosidade. Hoje, volto a fazer por necessidade.
Mãe, toda vez que venho aqui, leio seu caderno para conseguir chorar. Esse choro preso, amarrado, que não quer sair. Preciso chorar.

Mãe!! Aonde esta minha irmã?

Dia das Mães - autor desconhecido

Certa vez perguntaram a uma mãe qual era o seu filho preferido, aquele que ela mais amava. E ela respondeu: nada é mais volúvel que um coração de mãe. E como mãe, lhe respondo:
O filho dileto, aquele que me dedico de corpo e alma, é:
O que está doente, até que sare.
O que partiu, até que volte
O que esta cansado, até que descanse.
O que está com fome, até que se alimente.
O que esta com sede, até que beba.
O que esta estudando, até que aprenda.
O que está nu, até que se vista.
O que não trabalha, até que se empregue.
O que namora, até que se case.
O que se casa, até que conviva.
O que é pai, até que os crie.
O que prometeu, até que cumpra.
O que deve, até que pague.
O que chora, até que se cale.

E já com o semblante bem distante daquele sorriso, completou:
O que ja me deixou, até que o reencontre.

Resto de vida

O tempo que me reste, fiquei resto de vida.
Vida que tinha inteira, agora metade de vida que me resta.
Me arrasto na vida sem ti, agora são suspiros e lamentos na vida que sobra, como sopro de dor em vida chorando.
Tento caminhar, ando devagar. Tento viver, vivo tentando. Ela não volta mais. Sorri pra mim, ainda sai pra estudar, ainda chega do trabalho e cuida de seu menino com amor de mãe. Está em mim, mas não posso vê-la, canta canções que não consigo ouvir.
Que dor é essa? A saudade queima o peito! Fala comigo! Quero te ouvir...

O tempo que me reste, serei resto de dor.

óculos sem pernas, celular sem crédito, boca sem dentes, pele marcada, sandália quebrada, corpo gordo e maltratado, fome insana, angústia profana, saudade indecente, dor lancinante, presente de futuro embaçado, passado marcado, mulher sem amor, carência cruel, amigos longe, netos distantes, mãe sofrendo, irmãs em apuros, carteira vazia, alma latente, coração apertado, sol com frio, prisioneira sem grades, pés ressecados, vontades guardadas, dependente, agoniada, frustada.

O tempo que me reste serei resto de dor.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Chris,

Toda vez que penso em escrever algo, me emociono e não consigo. É muito triste saber que você não esta mais entre nós.
Mesmo a distância, sem te ver por muito tempo, sempre ficava sabendo uma coisinha aqui e outra ali, sabia que estava bem e que um dia ou outro íamos nos encontrar.
Mas com sua partida isso muda tudo; nem fui me despedir de você... e agora só ficaram as lembranças... boas lembranças! Brincamos e brigamos bastante, muito normal...
Lembro que quando brigava com você te chamava de “adultona”, porque você sempre foi mais adulta do que nós e que quando te convidava para uma festa de aniversário, você já avisava logo, só ia se tivesse brigadeiro... nada boba!
Era muito bom... agora ficaram as saudades...
O que nos conforta é saber que você está em um lugar muito bom, com sua missão cumprida e com certeza feliz!
Saudades, Saudades, Saudades...

Sua prima,


Claudia Dol da Silva


10/12/2006

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Viver é show fantástico.

por Ana Paula de Freitas

Eu dedico este texto para a Roseli que perdeu sua filha Chris, a qual amava muito, e que por sinal foi uma de minhas melhores amigas. A morte é a única certeza que temos em vida. Portanto, seja feliz e viva cada momento de sua vida intensamente, como se fosse único. Peça à Deus forças e conforto no seu coração, afinal uma vida se foi mas ainda temos muitas vidas para nos dedicarmos aqui... (irmãos, filhos, netos, marido, amigos, etc...). Que Deus te abençoe.

Viver é show fantástico

Você pode ter defeitos, viver ansioso, chorar e ficar irritado algumas vezes, mas não se esqueça de que sua vida é o maior tesouro do mundo.
Lembre-se sempre de que ser feliz não é ter um céu sempre azul, caminhos sem obstáculos, trabalhos sem fadigas, relacionamentos sem decepções.
Ser feliz É encontrar força no perdão, esperança nas batalhas, segurança no palco do medo, amor mesmo nos desencontros.
Ser feliz Não é apenas valorizar o sorriso a alegria, mas também refletir sobre a tristeza. Não é apenas comemorar as vitórias, mas aprender lições nos fracassos. Não é apenas alegrar-se como os aplausos, mas encontrar alegria na escuridão.
Ser feliz É reconhecer que vale a pena viver a vida, apesar de todos os desafios, incompreensões nos períodos de crise, basta saber aproveitar. Ser feliz Não é uma sorte do destino, mas uma conquista de quem sabe viajar para dentro do seu eu interior.
Ser feliz É deixar de ser vítima ou réu nos problemas, é se tornar o autor da própria história.Ser feliz É atravessar desertos, ser capaz de encontrar um oásis escondido em sua alma. É agradecer a cada manhã pela vida.
Ser feliz É não ter medo dos próprios sentimentos e saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um... "Não". Ser Feliz É saber receber com segurança uma crítica, mesmo que seja injusta. É beijar os filhos, é ter momentos poéticos com os amigos, mesmo que eles nos magoem. É deixar viver a criança que cada um tem dentro de si.
Ser feliz É saber admitir quando errou e dizer "Eu errei". É ser o primeiro a dizer "Me perdoe”. É ter sensibilidade para expressar "O que você tem mais de profundo no coração". É ter capacidade de dizer sem medo "Eu te amo".
Faça da sua vida um canteiro de oportunidades. Que nas suas primaveras você seja amante da alegria. Que nos seus invernos você seja amigo da sabedoria. E finalmente quando você desviar do caminho, comece tudo de novo, pois assim você terá cada vez mais amor pela vida e descobrirá que ser feliz não é ter uma vida perfeita. É saber usar suas lágrimas para irrigar a tolerância. Saber usar suas perdas para polir a paciência. Saber usar suas falhas para construir a serenidade. Saber usar os obstáculos para abrir as janelas da sabedoria.
Não desista nunca de si mesmo. Não esqueça nunca as pessoas que te amam. Não desista nunca de quem te ama. Não desista nunca de ser feliz, pois...


A VIDA É UM SHOW FANTÁSTICO

quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Portas

Limpas ou sujas. Falamos ou nos calamos, sentimos dores, angustias, decepções, mágoas e raivas.
Abertas ou fechadas, apodrecem e se acabam. Se abrem e se fecham, trazendo alguém indesejável, levando alguém que amamos. Por elas, passam um chato, entram ratos, saem baratas. Por elas, entram crianças felizes e bem amadas, saem outras tantas oprimidas, carentes e medrosas. Entra o sol, entra a chuva, sai poeira e água suja. Mas ela não tem dores, nem amores, não chora nem tem pudores. Fica lá, imóvel, dura, seca e surda.
Por ela passamos eu e você, seja qual for sua cor e seu tamanho, o desenho ou a pintura. Pode ter chave ou cadeado, correntes e trancas. Continua lá, parada, podendo ranger e ser batida.
Lá dentro, por detrás dela, escondem-se dores, gritos e sussurros, medos e loucuras, planos e esperanças, crenças e ceticismo. Nela, nada dói. Não importa se limpa ou suja, se lá dentro ou se lá fora, é ali que mora o medo.

Morte em vida (Dona Ignes)

A morte sentou se à minha frente. hora pálida, hora rouxa e sêca. A boca murcha, o abandono, a própria rejeição. Coração disparado, dores pelo corpo, nas pernas, nas artérias.
Solidão! Rejeição!Abandono!
A cova é igual pra todos: muda a pompa, talvez haja uma salva de vinte um tiros ou a carreata em cima do carro do corpo de bombeiros andando pela cidade; muda o tamanho da fila para o velório, os modelitos dos óculos e a grife das roupas e, talvez, até as cores dos lenços de seda usados para secar lágrimas, as falsas e as verdadeiras.
A cova é igual pra todos e fica a sete palmos abaixo do solo.Antes dela, bastaria uma visita por mês trazendo consigo uma caixa de bombons ou um pacote de bolachas. Quem sabe só um telefonema, uma visita com um pequeno sorriso. A cova é igual pra todos. Nela não caberá pertences, carros, jóias, pinturas ou perfumes franceses.
Sete palmos somente, para o político e o trabalhador, o mendigo ou o banqueiro, o bom ou o indecente.Se não há amor, poderia ser por compaixão, a piedade pelo abandono, pela clausura de uma vida morta. A hora vai chegar, seja você feio ou bonito, alto ou baixo, gordo ou magro, elegante ou mal vestido.
Não tem perdão, não tem por onde. Chega e carrega nos deixando todos iguais.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Pensando

Estranhamente, um dia pensei: não deveria ser assim. Com essa perda tão dificil, sem compreender o que se passou, com essa ausência tão cruel, tomada de dor renitente e saudade permanente, pensei que talvez pudéssemos vir a ser diferentes, pessoas melhores.
Pensei que a dor da morte que acontece na casa do vizinho e leva seu único filho, pudesse me fazer repensar a vida, já que tamanha dor eu jamais sentiria. Mas pouco tempo depois, a morte chegou na minha casa e carregou a vida de uma filha minha.
No meio de tanta dor e sofrimento tive a certeza de que as coisas que nos pertubam deveriam ser grãos de areia perto dessa dor tão devastadora. Mas não é assim que funciona. Fiquei surpresa. Nem mesmo com a morte de um filho se deixa de ser tão mesquinho? Que coisa é essa tão preemente, que afazer é esse tão importante, que nos tira a capacidade de perceber o que é de fato importante? O que é ser humano? O que é ser, humano?
Fato consumado, nem mesmo a morte de um filho nos deixa ser menos feio, menos perversos, vaidosos e prepotentes.
- Você esqueceu de secar os pés, está molhando todo o chão da sala!!
Os pés da minha filha, os pés do filho do vizinho, não mais ficarão sujos de terra, nem molhados da água da chuva; suas vozes se calaram, seus ouvidos estão surdos, enterraram suas gargalhadas.
O mundo não para, não pode e nem deve. A cada instante tantos filhos se vão, tantos filhos nascem; o dia ainda amanhece e no seu fim a noite ainda escurece; a chuva continua chovendo e a lua continua aparecendo; o sol continua nascendo e mais tarde continua se escondendo.
A Gal ainda canta Honey Baby e teremos sempre noites quentes.
E de repente, o céu se pinta de estrelas. O mundo ainda briga, o vicio ainda se alastra. As dores nunca cessam e o amor vai se diluindo. Valores se misturam, se perdem nos caminhos. À vida não é dada a importância merecida. Quando se acaba, escondemos a morte de nossas conversas.
Deixando-a de lado, voltamos à vida. Qual vida?

A vida que nos acorda sem nosso bem querer.
A vida que nos leva a deitar sem mais poder dizer: boa noite, até amanhã.
Por quê brigar por tudo se tudo é nada.
Por quê brigar por nada se nada é nada.
Pois tudo é nada e nada é tudo.
Tudo é ínfimo perto de sua partida.

Mas assim somos e quando o tempo passa, mesmo com a dor e a saudade, voltamos a ser mesquinhos e brigamos por tudo, reclamamos de tudo
Resta a esperança (e eu tenho certeza) de que uma mãe muda sim muitos valores.

O que sou?

sou carne, sou osso e coração
sou amargura, dor e revolta
nua, crua, mãe e as vezes madrasta
ingênua, louca, presa e solta
sou música, poesia e cansaço
ganho, perda e desaforo
sou busca, poeira, barreira, ventania e as vezes insana
vou crente, volto cética
vou na esperança, volto na angústia
sou sol morno, água fervente
bolhas de sabão, bolotas de algodão
tentativa de pureza com marcas de existência
tomando a frente, esperando o melhor
sou corpo de agonia, alma de correntes
buscando a cada dia, sonhando a todo instante
querendo a lua cheia, buscando as estrelas
fazendo promessas, ficando na espera
aflita, rejeitada, abandono
fui menina, fui ferida e fui susto
rua de terra, barranco, abacateiro
cobra, trator, mordida de cachorro
com um menino atrás da casa, da mãe a surra da ignorância
inocente no colo do vizinho, ingênua na safadeza do tio
correndo da vassoura, de tapa na cara na frente do namorado
fui medo de surra, pavor de pai
namoradeira, cheia de mentiras
brinquei com a vida e não percebi
sou passado, presente, quero ser futuro
estou apagada, quero me acender e ascender
estou paralisada, quero caminhar
estou assustada, meio apavorada, traída pela vida, pela crença que eu tinha
pensava no futuro de minhas meninas
ganhei um golpe do presente
tenho minha Mariana, filha que tanto amo, mas não consigo ter paz
tenho meus meninos queridos, mas não tenho sossego de alma
tenho a mim e os amigos, mas falta um pedaço de mim
busco tudo que posso para deixar essa fala
mas minha boca não cala, meu peito não se aquieta
meu coração não entende, minha cabeça não para
desassossego, desencanto, canto sem luz
gira o mundo, corre o carro, escorre a água
toca a sirene, a musica e o sino
ladra o cão, a fome cresce, o povo padece
a vida caminha, o dia amanhece, chega a noite e a lua aparece

e a perda?
real, ferida sem cura, buraco vazio.

Chora céu! Aniversário de Elis, saudades da Chris.

Céu enegrecido, por vezes clarões riscando seu infinito. Ouço trovoadas que parecem gritos de dor. Ele está se preparando para mandar sua água.
Há muito Elis se foi, há pouco se foi Chris. Elis e minha filha deixaram seus filhos, filhos que ficaram sem mãe. Triste constatação, essa. Filmes e fotos, tudo é tesouro, alento pra quem fica.
Queria assistir ao seu aniversário, Elis! Se estivesse aqui, queria cantar com tua alma pela partida da Chris. Carregou com você sua voz, mas deixou-a para a eternidade. Estaria fazendo sessenta anos, como seria? Continuaria sendo Elis brava, Elis pimenta, voz de prata saindo da garganta de benção?
Ouvi pelo rádio que havia partido: me joguei na cama soluçando sua ida. Elis guerreira, pequena grande mulher. Gigante. Elis inquietante, borbulhante, de gestos grandes e presença marcante.
Lembro-me sempre de Elis: adorava vê-la, era um deleite ouvi-la.
Te conheci rapidamente, apenas quando fui me despedir. Estava maquiada, um batom rosa, na mesma cor do batom que passaram nos lábios da Chris. Quisemos que partissem bonitas dessa vida aguerrida, dessa luta feroz...
A Chris faria 34 anos em maio. Chris guerreira, mas de gestos amenos. Presença aconchegante. Todos os dias, com seus minutos e segundos, lembro da Chris. No dia de hoje, misturo as duas. No dia de hoje, continua a pergunta: onde está a Chris, onde está você, Elis? Peço que a encontre, cante para ela que tanto curtia te cantar e te ouvir, desde criança ouvia-me te exaltar. Cuide dela por mim e mande um recado: quero que sejam felizes, que curtam o paraíso. Cuidaremos dos que aqui ficaram até que todos nos encontremos.
Céu enegrecido, as trovoadas continuam ensurdecendo meus ouvidos, descarregando sua ira, jogando na terra a sua dor, despejando todo o seu choro.
A dor que tenho hoje faz com que eu perceba que cada um carrega a sua. Tanto a dor quanto a saudade são únicas. Nada de dentro, nada da alma, pode ser dividido: te dou um pedaço de pão, divido contigo um copo de vinho, mas dor, agonia e desespero, cada um de nós sente a a sua.

Feliz Aniversário

O mês de maio está próximo e com ele seu aniversário está chegando e não posso mais te desejar felicidades, nem mesmo mandar um telegrama. Queria cantar tua alegria, queria brindar o seu carinho, escutar mais uma vez você cantar Banho de Espuma, reunir os seus amigos e ouvir suas histórias. Dia seis passarei sem tí, quero que seja feliz.
Perpetuo nessas folhas todo amor do mundo, cravo nessas palavras minha saudade eterna. Levarei comigo seu jeito doce de ser, sua bondade e compreensão.
Palavras se perdem ao vento, mas não essas, pois deixo-as cravadas de lágrimas, dor, saudade e lembranças. Essa homenagem, meu amor, cheia de dor e saudade, ficará para quem te amou e te respeitou.
Você partiu cedo mas derramou na terra amor, ternura e carinho. Chorou teu choro de agonia, fechou teu peito na tristeza, trouxe no ventre seu fruto de um amor, lutou sua guerra, rumou seus últimos dias de vida acreditando na vitória. Pararam seus passos, calaram seu grito, te de deixaram na dor. Arrancaram seu sorriso, cerraram seus olhos.
Fica uma saudade imensa e a grande certeza: o meu amor, o amor do seu filho, do seu pai e da sua meio filha meio irmã , ninguém, ninguém poderá nos tirar.

Um novo dia

A cada acordar, te busco no abrir dos olhos. O peito se aperta e começo a chorar. A tristeza é tão grande, tão cheia de um vazio imenso! Busco correndo sua irmã, seu pai e as crianças. O dia é de fato novo e sua ausência é de fato eterna. Ligo o rádio e penso: por hoje minha vida continua. Estou buscando o que já busco há vários anos, mas com uma doída diferença: as dores e mágoas são maiores.
Quero fazer plágio de algo que li não sei onde para dar cor à minha vida:

Meu pai era escuro. Minha mãe, lilás. Minha vida já foi cor de rosa e meu coração dourado. Hoje estou transparente mas cheia de um verde crescente, buscando desesperadamente o branco da paz, que por ora se faz ausente. Conto com o dia que chega brevemente carregando em seu céu um azul singelo e uma lua de prata. Passeata de estrelas e cantos a beira mar, uma roda de amigos e paz a borbulhar. Não passo te buscar, não pode mais voltar. Tenho que aceitar,mas antes, preciso aprender. Me falta o chão, me falta a respiração. Falta sua vida, falta você!

Feliz Ano Novo

2005 está quase chegando. 2004 te levou de nossas vidas.
No meu coração tenho espinhos cravados deixando o sangue correr escondido.
Não posso sorrir para os convidados. Só consigo comer sem parar, pensando que a dor de sua ausência pode ser aliviada com o ato de mastigar sem parar.
Não sei por que você foi embora sem dizer adeus. Não entendo. Se sabia que ia viajar deveria ter me avisado! Tentaríamos conseguir uma passagem pra você poder voltar.
Queria muito saber se de onde você está consegue escutar o barulho dos fogos de artifício. Estouram muito forte e eu, inerte, sentada na calçada, sem conseguir chorar.
Não se cubra essa noite, está calor e pode ser até que chova. E se o céu chorar, juntarei minhas lágrimas com o choro dele para encharcar meu peito pequeno, estreito, tão apertado.
Ouço vozes, risadas e choro de crianças, ouço o tiroteio dos fogos avisando que o ano novo vai chegar. Só não avisam que você não vai estar.

Feliz Natal

Não queria nada. Bebida nem comida, sequer possível serenata. Não precisava mesa farta nem frutas adocicadas, não precisava roupa nova, presentes nem cabelos arrumados.
Podia ser calça furada, chinelo de dedo, cabelo desgrenhado. Feijão com arroz, bife quase queimado, e uma salada bem temperada como você gostava. Qualquer toalha, pratos sortidos e pequenos, copos de requeijão.
Por que só hoje eu vejo que poderia ser assim? Como se pode saber que estando todos juntos, que é o que importa, poderia ser tudo mais simples? Só mais uma data, só mais uma noite que no dia seguinte vai encontrar mais um dia, como qualquer outra noite encontra o dia seguinte. Por que precisa alguém ausente pra gente perceber que tudo poderia ser diferente? Tudo simples, mas com você aqui! Quando não falta alguém tão amado, come se muito, bebe-se bastante, as pessoas se maquiam e põe roupa bonita, compram presentes. Afinal, não se pode saber que um dia, e sempre haverá um dia, vai faltar alguém...
Alguém que se foi há muito tempo. Alguém que se foi há pouco tempo. Alguém que se foi há pouquíssimo tempo. Que festa é essa? Aniversário de Jesus? Que festa é essa onde piscam luzes em árvores de Natal, nos prédios, nas portas dos comércios, piscam na cidade, no país inteiro, no mundo todo? Que festa é essa onde se come muito enquanto milhares de seres humanos estão abandonados?
Quando um filho se vai para não mais voltar pode se ter mesa farta, banhada a ouro e em cima dela lagosta e caviar. Tudo terá seu próprio gosto. Sempre teremos pessoas ausentes e continuaremos a ter, as noites de Natal continuaram chegando. Mas com um filho ausente, arroz com feijão será suficiente.

Está chegando

O natal está chegando, não sei o que fazer. Ficar sozinha ou me arrumar e sair, comer que nem louca enquanto espero a meia-noite para dizer Feliz Natal? Feliz o quê?
Não te ver sorrindo, cantando Jingle Bel com a tia Sonia, não sorrir ao ver você batendo nos copos de cristail? Não te ver feito criança diante da mesa farta com seus olhos gulosos sem saber o que comer primeiro?
Feliz o quê, saber que dormirá para sempre? Saber que no fim de ano não vai mais acampar?
Será que vão pagar pelo o que fizeram, pelo o que não fizeram?
Quanto custa uma vida?

Susto!

Meus olhos se abrem acordados pelo susto... a Chris se foi!
Vejo-a naquele caixão e enlouqueço quando lembro seu corpo mal ajeitado. O que isso importa agora? Sua vida não estava mais ali. Roubaram-na naquela cidade escura e fria, naquele imenso matadouro.
Quanta crueldade fizeram contigo, meu doce. Que maldade te mandarem pra casa doente, morrendo, enganaram a todos fazendo-nos crer que tudo estava bem. Mentiras, tudo mentira!
Malditos, todos malditos! Pais, filhos, tios, primos, sobrinhos ou irmãos. Católicos, evangélicos, espiritas, ateus, cristãos, judeus, budistas, hari krishnas, quantos são eles? Mostra pra mim filha! Quero ver um a um, olhar nos seus olhos, entrar em seus cérebros. Será que eles tem, será que pensam? Será que dormem à noite, conseguem repousar em paz? Se vestem de branco e andam apressados, entram nos quartos aviando receitas. Alguns, de repente, até sorriem, mas brincam de faz-de-conta.
Vem meu amor, senta ao meu lado e conta para mim. Quantos foram, quem são eles? Te abriram e quando fecharam sabiam que estava acabado, sabiam que o fim estava chegando...
Na tentativa de se eximir, disseram que você fazia teatro. Queria Coca-cola, dormir um pouco para descansar de tanta dor? Pediu um Diazepan? Tanto tempo sem dormir! Pediu um pote de gelatina? Estava exausta, lutou sem parar, sofreu cada minuto de todos aqueles quarenta dias.
Te vejo na porta de calção azul:
- Mãe, me leva pro hospital, não aguento mais de dor.
Todos dormiam, nem recado deixei. Fazia teatro? Por que não estava ao palco? Nem vi a cortina se abrir!
O telefone tocou, era seu pai. O espetáculo havia chegado ao fim e a platéia permanecia na calçada. Mas não era porta de um teatro, era do matadouro. Quando a Mari chegou, pensei que ainda podia dar certo, vai dar certo! A casa cheia, o desespero, a dor. Não gritava, não chorava nem morria, andava pela rua com meu corpo de agonia, com o coração rachado. Eu já sabia, ela não voltaria mais.
Lembra daquela senhora, na cama em frente a sua, enquanto você se recuperava da cirurgia? Você dizia: coitada dela, mãe, sente tanta dor!Sua generosidade nunca te abandonou. Mesmo no meio de sua dor, enquanto sofria, lamentava a dor vizinha...

Amanheceu

O dia está chegando mas o céu ainda está cinzento com o sol se preparando para chegar. E meu peito, até quando vai suportar?
O pássaro cantador já está voando pelo quintal enquanto a casa ainda dorme.
O meu sono já se foi. Acordo com você todas as manhãs, deito com você todas as noites.
É a lei da natureza, é a vida... mentira!!! A lei da vida é viver bastante, a lei da natureza é os pais irem antes.
Onde você está? Dorme? Canta Rita Lee e Gal? Assiste às vídeo cassetadas junto com o Cauê? Gargalha solta no sofá? Que delícia te escutar, ver seu lado criança se manifestar. Onde você está?
Meu peito bate forte, meu corpo treme. Já são longos e penosos nove meses de saudade. Que vida mais estranha! Seu sobrinho Leon chegou ontem à noite. Um dia apenas separando a data da chegada da vida com o dia seguinte marcando nove meses de sua partida.
O céu já está mais claro e a casa ainda dorme. Meu peito chora, a saudade aflora e traz a dor que corrói.
Trouxe comigo para o quintal o livro Perfume de Eliana, escrito por Alice, sua mãe, que a perdeu em um acidente de carro aos vinte e poucos anos. Não consegui ler A vontade de falar com você chegou, imperiosa.
O jardim está lindo! A figueira de seu pai, frondosa, majestosa.; os brincos de princesas, ou lágrimas de cristo, estão maravilhosos; as rosas, vermelho vida, vermelho amor, esplêndidas. As margaridas ainda não vingaram. Espero, ansiosa.
Vem chegando o azul do céu e a casa ainda dorme. Que silêncio bom!
Falta meu bichinho, o teu doce frutinho.
Seu pai perdido, sofrido e sem rumo. Sua irmã cansada, exausta e ansiosa. Todos buscando você, buscando viver, na busca do por que.
O dia já amanheceu. Você já acordou? Sempre quis dormir um pouco mais e o Cauê nunca deixou. Hoje está estabelecido que dormirá para sempre. Por quê? Me diz, quem decidiu? Poderia dormir aqui, eu levaria o Cauê para passear. Você dormiria em paz. Mas não para sempre. Não precisavam te levar.
O dia chegou e a luta vai começar, vem me ajudar, vou comprar Coca-Cola, posso fazer um pão. Você não tem que estudar? Filha vem pra casa almoçar. E se o Flávio te ligar? Terá tempo para conversar? Ah! Meu amor, onde você está? Diz logo, a Mari pode te buscar. Não, não quero resposta, eu sei onde você está. Só preciso te encontrar, acariciar seus cabelos, apertar suas bochechas...
O que sei, só o que sei, é que viva o quanto eu viver minha pergunta ninguém irá responder: por que?

A, B, C, D...

absurdamente insano,
bestamente por descaso,
com certeza desumano,
dolorosamente verdadeiro,
erradamente no tempo,
francamente um abuso,
geladamente sem critério,
humanamente inaceitável,
ignorando a dor,
jogando com o tempo,
kalundun,
lamentavelmente ineptos e adeptos,
magramente humanos,
nefastos,
obedientes,
perfeitamente indecentes,
querendo despachar,
redondamente impunes,
sabiamente cretinos,
turvamente mentem,
urubus ululantes,
vagarosos,
zuando, zunindo.

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Repetição

Dor indecente e insistente que só se acumula, sem piedade.
Mal estar poluente, grudado em meu corpo sem trégua calmante.
Quero beber, quero descer, rejuvenescer, voltar a viver.
Sem escora, dependente, carente. Chega dessa demora.
A volta de dentes sem vergonha de dar risada, jogar cartas, gargalhar.
Dor que dispara, aperta o gatilho e da nó na garganta.
Me veste de medo, me despe com fogo.
Tudo se mistura e queimo em desespero.
Deito com minhas dores, saudade, doente ainda.
Busco minha cura, demora em chegar.
Curar minha dor e saudade sei que não vai dar.
Espero-as menor e a amenização da minha doença.
A noite está quente e a mente inquieta.
Correm pensamentos.

Sem nome

Sem nome, acordei na madrugada.
Arrumação, dor e solidão, poeira, sujeira, roupa jogada, tomada quebrada. Assisti ao seu filme pela metade, mais presente impossível. Muita comida, chocolate, muito cigarro. O telefone não toca, como agir?
Ela pediu um dia: tome conta do Cauê se algo acontecer. Soube disso depois que partiu.
Muita agonia, ficando imensa, a fome não sacia, o refrigerante corrói, devassa, tomo direto da garrafa.
O tic-tac do relógio atordoa, a alma enferruja. A família e os amigos nada entendem. Eu nada entendo, vivo agressiva, vem de repente, talvez seja medo da loucura. A morte traz o descanso, mas não quero partir. Meu pai me visita em sonhos insistentes, minha mãe ainda em sua missão doente, pessoas loucamente ausentes da vida, da razão, do pé no chão.
Assassinos impunes, corrupção servida em bandejão, ano de copa e eleição, venda nos olhos do povão.
Acordo sem nome, deito assustada, os meses se arrastam e o túnel continua escuro. O dia se arrasta, me arrasto pesada, carente, ausente e pedinte, comendo a comida que não pago, bebendo da água que não é minha, fumando o cigarro sem poder comprar, usando a luz sem poder pagar.
Reina um silencio com barulho de armas em transe, carros passando no farol vermelho, o relógio correndo antes que a pilha se acabe. Portas mudas no seu papel, abertas ou fechadas, o varal tem roupas penduradas enquanto as máscaras continuam postas, difícil para todos arrancá-las.
Assim vai chegando o dia e as correntes continuam se encaixando na engrenagem. Bom dia para o chefe de cara feia, água no fogo para o café, o lixo saindo para a rua, a condução lotada carregando gente como se fossem bois.
Os dias assim se passam e eu enjaulada no sofrimento e na vergonha, na dor e na sujeira do corpo sem banho, no susto de uma boca sem dente, total carência de um beijo e um abraço.

Chris, bom dia!

O sino está badalando seis horas, acordei e sabia que não poderia dormir mais, pelo menos não imediatamente.
Hoje é o dia de seu aniversário e quero converssar com você. Ontem, ao telefone com sua irmã, tive uma crise de choro. Não entendo o que aconteceu, não entendo porque não pude fazer nada por você.
Se não tenho culpa por ter partido, preciso que venha me dizer pois penso que precisava ter feito algo mesmo eu não estando no mundo real, pois me encontrava em outro lugar.
Nos poucos sonhos que tenho com você, percebo que está bem mas você não diz nada e aí, fico indecisa.
Lembro que você lamentava a morte da Helena por ela ter partido tão jovem e você se foi, tão jovem também.
Quero que tenha uma festa onde está, muitos beijos e muitos abraços apertados.
No dia do seu aniversário eu mandava sempre um telegrama mas como não sei seu novo endereço vou lhe deixar uma mensagem:
Quando estiver caminhando não se esqueça de levantar seu lindo e longo vestido prateado, para que ele não se enrosque em suas lindas sandálias de estrelas.
Mantenha seus lindos cabelos soltos, com lindas margaridas ao longo de seus fios.
Com suas mãos de dedos longos e finos, faça carinho nas nuvens que passam ao seu redor e quando colher flores, coloridas e macias, coloque-as num canto fresco e iluminado para que seu perfume possa chegar até mim e me envolver como se você estivesse por perto.
Agora, vejo seu sorriso, largo e doce, seu rosto está feliz, sua alma leve e alegre, seus passos suaves e cuidadosos.
Aqui o dia está chegando, os relogios se contrapoem ao seus sons, estou fora da jaula, fétida de cigarro e há restos de comida. O ar está impregnado de desespero, medo e solidão.
Poeira por toda parte, roupas limpas e sujas se misturam, a porta sempre fechada assim como está meu coração desde que partiu. Amo você.

Escrito em 06 de maio de 2007